Aglaé D’Ávila Fontes, uma das mais importantes pesquisadoras de cultura
popular de Sergipe, prepara seu 14º livro. Nesse seu novo trabalho, ela
se debruça sobre as Caceteiras e a Chegança, dois grupos tradicionais do
município de São Cristóvão, e mais uma vez busca, através do registro
documental, guardar a memória do patrimônio imaterial do Estado.
Ao longo de todos esses anos de pesquisa, Aglaé já escreveu sobre
praticamente todas as manifestações folclóricas de Sergipe, com destaque
para o livro ‘Danças e Folguedos’. A pesquisadora nunca abandonou seus
estudos sobre a cultura popular, paixão que divide com seu trabalho de
gestora na área da cultura.
Atualmente, ela ocupa o cargo de secretária de Cultura de São
Cristóvão e é membro do Conselho Estadual de Cultura. Nessa entrevista
ao Sergipe Cultural, Aglaé dá detalhes sobre seu novo livro e fala sobre
a cultura popular e a valorização da identidade do sergipano.
Aglaé Fontes - Estou me preparando para publicar um
livro sobre a Caceteira e a Chegança de São Cristóvão e a figura do
mestre Rindu. Esse novo trabalho é voltado para Educação Patrimonial
pela vertente do Patrimônio Imaterial. Escolhi a figura do mestre Rindu,
que é o chefe da Caceteira e da Chegança. Ao fazer esse trabalho, além
dos dados do brincante, faço uma homenagem a ele por conta da sua
importância para a cultura local e sergipana de modo geral.
Sergipe Cultural - Por que a escolha das Caceteiras e a Chegança?
Aglaé Fontes - Ninguém nunca publicou um trabalho
voltado somente para a Catecetira. Não há nenhum registro sobre isso, e a
minha ida para São Cristóvão me oportunizou ter um acesso muito fácil
tanto à Caceteira quanto à Chegança, através do mestre Rindu. Há mais ou
menos um ano que estou levantado os dados sobre a vida dele e sobre os
grupos. Esse meu trabalho faz um levantamento histórico da presença dos
grupos em São Cristóvão e do acervo poético deles. É um importante
registro que pode se juntar à força da história de São Cristóvão para
melhorar o perfil dessa cidade que tem uma praça como Patrimônio da
Humanidade.
Sergipe Cultural – Na sua opinião, qual a importância da cultura popular para a formação das novas gerações? Qual a importância da escola nesse processo?
Aglaé Fontes - A escola deveria se preocupar em
divulgar a nossa cultura e a literatura oral do nosso folclore. Hoje
elas trabalham muito com os clássicos, chamados contos de encantamento, e
não trabalham esse outro lado, os contos populares. O manancial de
contos populares que Silvio Romero resgatou não chega às escolas, por
exemplo. Elas deveriam ter um olhar mais pensante sobre a cultura
popular. Para que isso ocorra faltam duas coisas: informação e decisão
política. É muito importante que os mais jovens tenham conhecimento da
sua historia cultural e da sua cara. A gente tem que ter orgulho das
coisas do nosso estado. E como eu posso ter orgulho da minha cultura, se
eu desprezo a cultura popular?
Sergipe Cultural – Como você vê esse universo da cultura popular em relação às novas tecnologias?
Aglaé Fontes - Me preocupo, porque estamos vivendo
numa época digital com uma velocidade muito grande da informação e não
aproveitamos isso para inserir a cultura popular. Não adianta realizar
um ou outro evento. Na verdade, eu tenho mágoa da palavra evento,
porque é ‘vento’, é passageiro. O que importa para a nova geração é
aquilo que deixa semente, a semente está na ação da professora na
escola, está no livro, está no registro. Fora isso tudo é ‘vento’. Não
fica nada. Hoje em dia as crianças e os jovens não conhecem a própria
cultura e os significados do nosso folclore. Reconheço, apesar de tudo,
que já teve alguma melhora. A universidade, por exemplo, tem se
preocupado em pesquisar sobre os diversos grupos. Mas ainda tem vários
pontos que precisamos melhorar. As comunidades populares também estão
perdendo essa essência, por conta do encantamento das tecnologias. Os
netos e filhos dos brincantes já não querem mais tomar parte dos grupos.
E isso é muito preocupante.
Sergipe Cultural – De onde vem essa sua paixão pelo folclore e pela cultura popular?
Aglaé Fontes – Para explicar isso eu tenho que
voltar para um passado bem distante. Na fazenda do meu avô, o pai da
minha mãe, sempre teve Reisado. Quando criança no interior eu tinha
contato muito próximo com as festas populares. Minha mãe sempre teve um
encantamento especial pelos grupos folclóricos e por isso desde cedo eu
assistia às apresentações, eu gostava muito, tanto que minhas
brincadeiras com meu irmão eram de Cacumbi e Chegança. Eram essas coisas
que feriam nosso imaginário. Quando eu tive escola sempre valorizei a
cultura popular. Quando comecei a fazer pesquisa não tive como fugir
desse universo. A pesquisa e o registro documental é uma forma de
eternizar nossa cultura e nossas raízes. Se nos distanciarmos da nossa
cultura e perdermos nossa cara, teremos aonde procurar para saber como
era.
(Texto: Carla Sousa, da Ascom/Secult)
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